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Sistema de recompensa alimentar: você sabe como funciona?

Você já deve ter se perguntado o porquê dos indivíduos com obesidade muitas vezes sentirem mais fome do que indivíduos que possuem uma rotina de alimentação saudável. A resposta é bem complexa e envolve os mecanismos de recompensa alimentar, que nos dá a sensação de fome ou saciedade.

A obesidade está diretamente relacionada com o excesso alimentar, principalmente pela busca de alimentos com maior palatabilidade e densidade energética, como os fast foods. Muito além de uma questão estética, a obesidade é uma doença e fator de risco para diversas outras patologias 1,2

Em nosso corpo, podemos elucidar dois tipos de sistemas de recompensa: o fisiológico, que busca manter a homeostase energética e que inclui os hormônios da fome e da saciedade, como insulina, leptina e grelina, além dos neuropeptídeos anorexígenos e orexígenos, os quais atuam em nosso cérebro, controlando o apetite, e assim, a homeostase energética, e o sistema  não homeostático, mais conhecido como sistema de recompensa hedônico, que nos dá a sensação de prazer alimentar, e se relaciona aos aspectos do alimento, como sua cor, cheiro, textura e forma, e a vontade de comê-lo 3-9.

Você provavelmente nunca viu alguém ter compulsão por alface, ou por cenoura ou por chia. O que eu quero dizer é que alimentos pouco saborosos não são consumidos em excesso, enquanto alimentos com maior palatabilidade (ricos em açúcar e gordura), como os fast foods, são. O consumo desses alimentos muitas vezes vai além do que o organismo necessita (necessidade energética)10-16.

Isso ocorre porque alimentos como os fast foods alteram as respostas do apetite, a fim de aumentar o seu consumo, além de ativar o sistema de recompensa cerebral, promovendo um maior incentivo na busca e/ou obtenção desses alimentos 17,18. Ou seja, comer um alimento de maior palatabilidade pode te deixar menos saciado após a refeição e com maior desejo de comer mais, ou comê-lo novamente, mesmo você já tendo suprido a sua necessidade energética.

Composição do sistema de recompensa

         O sistema de recompensa alimentar é composto por três componentes:

         O componente hedônico (liking), a motivação / incentivo (wanting) e a aprendizagem (learning)19.

  •       Hedônico (liking): representa, por exemplo, a antecipação do prazer que um indivíduo tem em comer um alimento de elevada palatabilidade.
  •       Motivação (wanting): ocasionada pelos sinais de recompensa que o indivíduo tem em comer um alimento, levando-o a buscar mais alimentos de alta palatabilidade e densidade calórica.
  •       Aprendizado (learning): significa o indivíduo repetir o ato, até ficar habitual sua busca por esses alimentos 20.

Obesos apresentam um aumento na vontade de comer alimentos de maior palatabilidade e densidade energética, mesmo não sentindo fome, e ainda podem apresentar um aumento na vontade de comer, com a diminuição da sensação de prazer alimentar após as refeições, representando uma resposta prejudicada do sistema de recompensa alimentar, o que muitas vezes justifica  o fato de comerem além de suas necessidades 21.

Pode até parecer um certo tipo de gula, mas, na verdade,  o cérebro dos obesos está ´´pedindo´´ aqueles alimentos, ao mesmo tempo que quando consumidos, o cérebro ´´nega´´ a sensação de prazer vinda desse consumo, fazendo com que ele coma mais para ter essa recompensa ou compensação do ´´prazer´´.

Diversos hormônios e mensageiros neuroquímicos parecem estar envolvidos nesses processos, como o GABA, a acetilcolina, serotonina, encefalina e a Dopamina.

A dopamina é um neurotransmissor relacionado ao desejo e prazer. Quando há oferta de alimentos, ocorre o aumento da liberação de dopamina, que atua, em parte, no sistema de recompensa.  A dopamina, quando atua em seus receptores, auxilia no aprendizado através da recompensa, ou seja, ensinando o cérebro que aquele alimento traz a sensação de prazer. Ainda, quando há o consumo de alimentos de alta palatabilidade ocorre a liberação de dopamina, que está intimamente ligada também ao nível de prazer obtido com aquele alimento, porém, nos obesos, ocorre uma menor sinalização da dopamina, uma vez que esses indivíduos possuem uma menor liberação de dopamina que o normal, assim como a diminuição do número de receptores, prejudicando o sistema de recompensa alimentar, fazendo com que eles aumentem a ingestão de alimentos em busca do prazer e da recompensa que não lhes foi gerada 22-24, 27

Uma outra curiosidade é que os obesos apresentam maior resposta dopaminérgica quando são mostradas imagens de alimentos, indicando que eles apresentam um aumento do desejo de consumir alimentos quando há oferta e menor sensação de prazer ao ingeri-los 25, 26.

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Considerações finais

Quando comemos alimentos de maior densidade calórica e mais palatáveis, ocorre a secreção de dopamina por diferentes regiões responsáveis pela recompensa, e pelo incentivo no sistema nervoso central. Por esse motivo, comer alimentos de maior densidade energética e maior palatabilidade, como os fast foods, faz com que o cérebro reforce a procura desse tipo de alimento, tornando mais difícil a adesão a uma dieta saudável. O mau hábito também irá incentivar o aumento do consumo desses alimentos (desejo), uma vez que indivíduos já sensibilizados apresentam mais fome e menor sensação de saciedade, reforçando ainda mais a busca por alimentos que os dê maior sensação de prazer 27,28.

Referências bibliográficas

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