Nutrição e síndrome pré-menstrual | Blog Nutrify

Nutrição e síndrome pré-menstrual

A Síndrome Pré-Menstrual (SPM), popularmente conhecida como Tensão Pré-Menstrual (TPM), é definida como um conjunto de sinais e sintomas físicos, psicológicos, emocionais e comportamentais que atinge mulheres entre 7 a 10 dias antes da menstruação, e que costuma desaparecer com o início do fluxo menstrual. 1,2 É considerada a maior e mais comum disfunção durante a idade reprodutiva feminina, afetando milhares de mulheres em todo o mundo.3 A maioria delas vivencia alterações durante o ciclo menstrual, mas somente quando são desconfortáveis a ponto de interferir no estilo de vida, diz-se que elas sofrem de SPM.1,2

Os sinais e sintomas mais característicos da SPM são dor nas mamas, edema, diarreia ou constipação intestinal, alterações de humor, cefaleia e modificações no apetite e no comportamento alimentar. Ainda pode ocorrer exacerbação de distúrbios dermatológicos pré-existentes, como a acne, bem como de problemas respiratórios e oftalmológicos.1,2,4 O tipo e a intensidade desses sintomas variam de mulher para mulher e entre um ciclo e outro. Podem ser classificados em leves, quando pouco perceptíveis; moderados, quando causam algum incômodo, sem prejuízo das atividades diárias; e graves, quando prejudicam as atividades diárias.3

A etiopatogenia ainda carece de esclarecimento, mas está relacionada ao eixo hipotálamo-hipófise-gonadal.2,5 Como os sintomas ocorrem concomitantemente às flutuações hormonais características do ciclo menstrual, é proposto um desequilíbrio hormonal, caracterizado por excesso de estrogênio e deficiência de progesterona e de serotonina, sendo este último um fator etiológico chave. 6 Além disso, podem estar envolvidos também: hiperprolactinemia, anormalidade de prostaglandinas e fatores nutricionais como déficit de vitamina B6 e magnésio.7,8

A prevalência em todo o mundo chega a 47,8%, e estima-se que cerca de 85% das mulheres apresentam pelo menos um sintoma pré-menstrual leve; 20 a 25% sintomas moderados a graves (SPM) e 3 a 8% atendem aos critérios diagnósticos para Transtorno Disfórico Pré-Menstrual (TDPM), uma condição mais grave e incapacitante, que acarreta em prejuízo dos relacionamentos pessoais e das atividades ocupacionais, tendo sido incluído como transtorno psiquiátrico na 5º edição do Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM-5).5,6,9,10

O diagnóstico da SPM pode ser dado na ausência de sintomas emocionais graves, se as manifestações físicas forem suficientes para causar prejuízo funcional.11 O American College of Obstetrics and Gynecology e o Royal College of Obstetricians and Gynecologists descrevem a SPM como qualquer número de sintomas psicológicos ou físicos, sendo necessário haver comprometimento funcional e recomendadas avaliações prospectivas. Já para a Sociedade Internacional de Distúrbios Pré-menstruais os sintomas devem causar comprometimento funcional e serem avaliados prospectivamente em 2 ciclos menstruais.9

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Aspectos gerais sobre o ciclo menstrual

O ciclo menstrual tem duração média de 28 dias, podendo variar de 20 a 45 dias, e ocorre como resultado direto das variações das concentrações hormonais no eixo hipotálamo-hipófise-gonadal: O hipotálamo atua na hipófise anterior, através do hormônio liberador de gonadotrofina (GnRH), responsável pela produção do hormônio folículo estimulante (FSH) e do hormônio luteinizante (LH), os quais estimularão os ovários a secretarem estradiol e progesterona que, por sua vez, induzirão o endométrio a se preparar para uma gravidez. Se esta não ocorre, o endométrio se desintegra, ocorrendo o sangramento e o ciclo se repete. 1,2,4

O ciclo menstrual pode ser dividido em duas fases: a folicular, que compreende o período do sangramento até a ovulação (inclusive), e a lútea, que se inicia logo após, estendendo-se até o início do sangramento. A fase folicular caracteriza-se pela presença dos hormônios FSH, LH e estrógeno, os quais levam ao crescimento do folículo ovariano e à ovulação, enquanto que a fase lútea é caracterizada pelo predomínio de progesterona, que atinge o seu ponto máximo logo após a ovulação.1,2,4

É esse aumento de progesterona durante a fase lútea o grande responsável pela retenção hídrica tão característica do período, que causa edema, dor e sensibilidade nas mamas e consequente aumento de peso corporal, atingindo seu volume máximo 2 a 3 dias antes do fluxo. Outra causa para o ganho de peso corporal durante o período menstrual pode ser o aumento da ingestão energética devido as modificações no apetite e compulsão alimentar gerados pelas alterações hormonais. 1,7,12

Alterações no apetite e comportamento alimentar

A SPM interfere no comportamento alimentar, causando alterações no apetite, no tamanho das refeições e na escolha dos macronutrientes, com aumento do consumo de carboidratos e compulsão por alimentos doces de modo geral. Essa compulsão ocorre devido à redução nos níveis de serotonina ou 5-hydroxytryptamine (5-HT), neurotransmissor que exerce importante papel no sistema nervoso. Com quantidades normais de 5-HT, a saciedade e o controle sobre a ingestão de açúcares são mais facilmente alcançados. 1,3,7,12

Através do consumo de alimentos ricos em carboidratos, aumenta-se a síntese de triptofano, aminoácido precursor da serotonina que, por sua vez, melhora alguns sintomas comuns da SPM, como a ansiedade, a depressão e a irritabilidade.12 Assim, mulheres que sofrem com SPM tendem a consumir maiores quantidades de carboidratos durante o período menstrual, motivadas pelo prazer subjetivo que esse nutriente proporciona, na medida em que essa ingestão é capaz de aumentar a produção de serotonina através do aumento da captação de triptofano.7

Nutrientes como coadjuvantes no tratamento da SPM

A ingestão de alguns alimentos pode atenuar os sintomas da SPM. De modo geral, as evidências recomendam o consumo de carboidratos complexos, alimentos fontes de cálcio, de piridoxina (vitamina B6), de vitamina D e principalmente fontes de triptofano, visto que este é o principal precursor da serotonina. Em paralelo, sugere-se reduzir o consumo de açúcar, sal, alimentos e bebidas com cafeína, álcool e alimentos muito gordurosos, que têm potencial de acentuar os sintomas.5,7,8

Cálcio e vitamina D são dois micronutrientes importantes no contexto da SPM. O risco de desenvolver SPM é significativamente menor em mulheres com alta ingestão de vitamina D e cálcio a partir de fontes alimentares. Esses aportes correspondem a aproximadamente 1200 mg de cálcio e 400 Ul de vitamina D a partir de fontes alimentares.7 Exemplos de fontes de vitamina D são peixes como sardinha, salmão, arenque e atum, gema de ovo, suco de laranja, óleo de fígado de peixe e exposição à luz solar.13

O cálcio pode auxiliar na redução das oscilações de humor, cólicas abdominais, edema e contrações musculares.14 Um ensaio clínico randomizado com 179 estudantes, da Universidade de Teerã, encontrou uma redução de 50% na depressão, apetite e fadiga em mulheres que receberam suplementação de 500 mg de carbonato de cálcio duas vezes ao dia durante três meses. Resultado semelhante também foi demonstrado em um estudo nos EUA com mais de 400 mulheres que suplementaram com 1.200 mg de carbonato de cálcio diariamente.15

Mulheres que sofrem de SPM costumam apresentar níveis reduzidos de magnésio, que pode estar relacionado com o estresse a que são submetidas nesse período. Esse estresse, por sua vez, estimula a secreção de glicocorticoides e mineralocorticoides que, além de aumentar a excreção de magnésio, também reduzem sua absorção intestinal.13. A administração de 200 mg/dia de magnésio é eficaz na redução dos sintomas da SPM. Alimentos ricos em magnésio como arroz integral cozido, suco de laranja, banana, amendoim, acelga e leite integral, podem ser adicionados à dieta durante esse período para ajudar na atenuação dos sintomas.7,14

A piridoxina ou vitamina B6 também tem sido utilizada no tratamento da SPM, já que atua como coenzima na biossíntese de dopamina e serotonina e, portanto, auxiliaria na redução de sintomas como ansiedade e depressão. Entretanto, sua eficácia ainda carece de evidências que justifiquem sua utilização. A recomendação diária é de 2 mg, não excedendo 100 mg por dia, uma vez que doses mais elevadas podem causar neuropatia periférica. 5,7,13,14,16

Alimentos ricos em carboidratos complexos podem ser interessantes na medida em que estimulam a produção de serotonina e regulam os níveis glicêmicos.14 Alguns trabalhos trazem uma associação positiva entre ingestão de isoflavonas da soja e redução dos sintomas da SPM. As isoflavonas são fitoestrógenos que ajudam a reduzir os altos níveis de estrogênio circulante, que contribuem para os sintomas da SPM.14,17

Quantidades adequadas de ácidos graxos ômega 3 na dieta são fundamentais para a saúde cerebral. O EPA e o DHA desempenham funções importantes no funcionamento do sistema nervoso central. Consumir alimentos com alto teor de ácidos graxos ômega 3, como peixes e frutos do mar, pode aliviar as cólicas menstruais ao estimular a produção de prostaglandinas, além de reduzirem a depressão. Os ácidos graxos ômega-3 podem atuar como agentes antiinflamatórios e reduzir a conversão do ácido araquidônico em prostaglandina F2 (PGF2), aumentando o nível de prostaglandina I2 (PGI2) que tem menor ação inflamatória. Embora alguns estudos revelem efeitos positivos do ômega 3 na redução de sintomas da SPM como depressão, ansiedade e baixa concentração, em especial quando essa suplementação é mais prolongada (por 90 dias), mais pesquisas são sugeridas para melhor investigar os efeitos dessa suplementação na SPM.14,18,19

Ainda, além da modulação dietética, o tratamento da SPM pode englobar aconselhamento psicológico, prática de exercícios físicos e, se necessário, terapia medicamentosa, embora nem todas as condutas sejam devidamente respaldadas.8

Considerações finais

Ciente das repercussões da SPM no que diz respeito ao apetite e comportamento alimentar, é importante que a investigação sobre as mudanças que ocorrem na mulher durante o período menstrual sejam consideradas na avaliação nutricional, visando a adoção de condutas mais específicas que, além de garantir o estado nutricional adequado, também proporcionem mais qualidade de vida, na medida em que atenuam os sintomas da SPM. Além disso, mais estudos são necessários a fim de se investigar os reais benefícios dos nutrientes no manejo da SPM aqui abordados, visando a determinação de recomendações dietéticas mais seguras e eficazes.

Referências bibliográficas

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Luana Miranda – @nutriluanamiranda

Aluna da Pós em Nutrição Esportiva e Estética 

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