Trabalho, metas, estudos, relacionamentos, cobranças. Vivemos em um mundo cada vez mais cercado de gatilhos estressantes. Segundo a Organização Mundial de Saúde, cerca de 90% da população mundial sofre estresse. Este pode ser definido como o estado físico e psicológico após agressões que afetam psicologicamente uma pessoa. Essas agressões surgem não só na fase adulta, mas, cada vez mais cedo. Em contrapartida, é preciso entender que o estresse sofrido é necessário e até positivo para o organismo, porém, o estado de desequilíbrio se inicia quando o indivíduo não consegue realizar o manejo desse estresse a passa a viver em um estado crônico.
Sabe-se que as consequências do estresse não são apenas psicológicas, mas também físicas, refletindo nas funções hormonais e em especial no aumento do cortisol.
Cortisol
O cortisol é um hormônio produzido na zona fasciculada das glândulas suprarrenais, e de grande importância para a homeostasia do organismo humano, sendo necessário para a manutenção dos níveis de açúcar no sangue, ou seja, é glicorregulador. Ele é liberado no organismo cerca de 7 a 15 vezes por dia e segue o ritmo circadiano, tendo maior liberação pela manhã e baixando os níveis ao longo do dia. Sabe-se também que o cortisol é sensível a fatores ambientais, como já dito, o estresse, portanto, questões emocionais influenciam no seu aumento. Tanto a alta como a baixa concentração de cortisol podem trazer prejuízo para o corpo, refletindo no aumento de apetite e acúmulo de tecido adiposo.
Dentre os glicocorticóides é o mais abundante e, portanto, responsável por várias atividades no nosso organismo, dentre elas a degradação de proteína, a formação de glicose, a lipólise, resistência ao estresse, efeitos anti-inflamatórios e depressão de respostas imunes, auxiliando no bom ritmo do sono e mantendo a barreira intestinal. No entanto, em níveis aumentados, uma das consequências é a permeabilidade intestinal.
Permeabilidade intestinal
Com a permeabilidade aumentada, lipopolissacarídeos saem do intestino e vão para a corrente sanguínea. Os monócitos, células da série branca, têm receptores TLR-4, onde os lipopolissacarídeos vão se ligar. O tecido adiposo atrai esses monócitos, através da proteína quimiotática de monócitos. Quando infiltrado no tecido, o monócito é chamado de macrófago e então são produzidas citocinas inflamatórias (TNF-α, IL1-β e IL-6).
Citocinas inflamatórias
As citocinas inflamatórias são proteínas de baixo peso molecular, com diversas funções metabólicas e endócrinas, que participam da inflamação e resposta do sistema imune. As principais fontes de adipocinas são os tecidos adiposos subcutâneo e visceral. Indivíduos com excesso de peso apresentam maior secreção das adipocinas pró-inflamatórias e menor secreção das anti-inflamatórias.
À medida que as citocinas inflamatórias são liberadas na corrente sanguínea, a 11βHSD1 é ativada, fazendo com que a cortisona se transforme em cortisol e, ainda, as citocinas inibem a 11βHSD2, que faria o papel inverso, ou seja, transformaria o cortisol em cortisona. Essa ação então gera excesso de cortisol, sendo produzido pelo tecido adiposo. Ou seja, o estresse aumenta o cortisol, que altera a barreira intestinal, aumentando a quantidade de citocinas inflamatórias no tecido adiposo e gerando mais cortisol. É o tecido adiposo se caracterizando como um órgão de função endócrina.
Pré-adipócito
Porém, a ação não se limita ao adipócito. A biotransformação de cortisona em cortisol também ocorre no pré adipócito, que é um adipócito novo, gerando uma diferenciação adipocitária. Ou seja, ele deixa de ser um pré adipócito e passa a ser um adipócito maduro. Em condições de aumento energético, essa célula adiposa nova está pronta para hipertrofiar, portanto, à medida que ocorre oferta calórica acima do necessário, essa nova célula estará pronta para aumentar.
À medida que o cortisol aumenta, há também um ávido desejo por aumentar a ingestão calórica, portanto, todo o organismo se encontra preparado para que haja formação de mais tecido adiposo.
Considerações finais
Com a falta de manejo do estresse ocorre a permeabilidade intestinal, liberando lipopolissacarídeos para a corrente sanguínea. Esses serão ligados por monócitos e, posteriormente, atraídos para o interior do tecido adiposo. Lá serão geradas citocinas, que aumentarão a transformação de cortisona em cortisol, enquanto que no pré-adipócito se diferencia em adipócito. Portanto, o estresse não controlado faz do organismo uma fábrica de tecido adiposo, ao mesmo tempo em que contribui para que haja mais fome no indivíduo. A oferta calórica faz com que o todo o ciclo se instale, tornando o organismo cada vez mais propenso ao ganho de peso e cada vez menos inclinado ao perfil eutrófico.
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