A história da Dieta Cetogênica | Blog Nutrify

A história da Dieta Cetogênica

A história da dieta cetogênica (DC) começou no início do século passado. Em 1921, o pesquisador Rollin Woodyatt notou a presença de três compostos (acetoacetato, Beta-Hidroxibutirato e acetona) em indivíduos que foram submetidos ao jejum ou a uma dieta muito restrita em carboidratos. No mesmo ano, o pesquisador Russel Wilder, sugeriu que a dieta cetogênica fosse usada para tratar crianças com epilepsia1.

Vale ressaltar que nas décadas de 1940 e 1950, com o desenvolvimento das drogas anti-epiléticas, a DC caiu em desuso. Na década de 1970 e mais recentemente nos anos de 1990, surge o interesse de associar a dieta cetogênica aos medicamentos para o controle da epilepsia refratária.

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Composição e alterações metabólicas

A composição da dieta cetogênica baseia-se em uma baixa ingestão de carboidratos e uma alta ingestão de lipídios2.

Carboidratos: 20g/ dia ou <5% cho/dia

Proteínas: 1.3 – 1.7g kg de peso

Lipídios: acima de 70%

Após alguns dias de restrição de carboidratos, as reservas de glicogênio hepático e muscular diminuem drasticamente, reduzindo a produção de oxaloacetato, lentificando o funcionamento do ciclo de krebs e diminuindo o fornecimento de glicose ao sistema nervoso central3.

Em relação ao sistema nervoso central (SNC), vale salientar que os ácidos graxos não atravessam a barreira hematoencefálica, por isso, não podem ser usados como fonte de energia. Após alguns dias de restrição, o SNC precisa de uma energia alternativa, o que leva à produção de corpos cetônicos (acetoacetato, Beta-Hidroxibutirato e acetona). Esse processo é chamado de cetogênese e ocorre, principalmente, na matriz mitocondrial do fígado.

A adaptação é a parte mais complicada, pois o indivíduo acaba apresentando alguns sintomas como cefaléia, queda da performance esportiva, concentração e déficit de atenção. Após um período máximo de duas semanas os sintomas diminuem, e isso ocorre porque os níveis de corpos cetônicos ultrapassam 4 mmol no sangue. Nessa concentração o SNC começa a utilizar os corpos cetônicos como fonte de energia, via transportadores monocarboxílicos (GLUT2) diminuindo os efeitos colaterais4.

Dieta cetogênica na obesidade

A obesidade acarreta um aumento de alguns marcadores bioquímicos, como a inflamação, dislipidemia e resistência insulínica. A ideia da DC é melhorar esses marcadores de inflamação, favorecendo o emagrecimento e melhorando o metabolismo da glicose tecidual. Algumas evidências apoiam a eficiência da DC na rápida perda de peso em obesos, em um curto período de tempo, porém, não há evidência de superioridade em comparação com uma restrição calórica convencional, em longos períodos acima de 6 meses.

Um estudo avaliou a variação dos níveis de dois marcadores de inflamação (PCR e TNF-α) na DC comparada com uma dieta convencional hipocalórica, não houve diferença significativa nos marcadores de inflamação7, mas os estudos mostram uma melhora do perfil de triglicerídeos, insulina, glicemia em jejum, Homa IR e HbA1C5.

Existem evidências que a dieta cetogênica produz um efeito sacietógeno, com redução espontânea do consumo calórico. Isso ocorre devido ao estímulo do eixo de saciedade hipotalâmica, via estímulo de GLP 1 (peptídeo semelhante ao glucagon que atua nos neurônios da saciedade (POMC).

Outro ponto importante na DC é o tipo de gordura da dieta. Dieta rica em gordura poli-insaturada tem uma melhor resposta na sensibilidade insulínica, triglicerídeos e colesterol, se comparada com uma dieta rica em gordura saturada. Deve–se atentar para alguns efeitos gastrointestinais, como uma maior constipação devido ao baixo consumo de fibras, podendo levar a menor produção de GLP-2 (Glucagon-Like Peptide 2) que desempenha um papel na regulação e absorção de nutrientes e da reabsorção óssea  e AGCC (Ácidos graxos de cadeia curta) que são produzidos pela microbiota intestinal e possuem papéis anti-inflamatórios. 

Dieta cetogênica no esporte

Os estudos sugerem que a dieta cetogênica pode prejudicar o desempenho esportivo, se comparada com uma dieta rica em carboidratos. Apesar do interesse recente nos benefícios potenciais das dietas ricas em gordura no desempenho esportivo ou na adaptação metabólica, os efeitos não são favoráveis.

Louise Burke (2015)6, comparou a dieta rica em carboidratos com a dieta cetogênica, em atletas de elite do atletismo, e foi observada uma piora no desempenho físico nos atletas do grupo cetogênico. A autora ressalta que, apesar da DC aumentar a capacidade de oxidação de gordura durante o exercício intenso, isso não refletiu em um aumento da capacidade aeróbia. Outro marcador importante é que os atletas submetidos a DC sofreram efeitos deletérios da massa óssea através da diminuição do IGF-1 livre.

No treinamento resistido, visando hipertrofia muscular, a DC não foi favorável, quando comparada com uma dieta convencional. O processo de hipertrofia se torna prejudicado devido a menor ação da mTOR (Mammalian Target of Rapamycin)  última via da sinalização anabólica7

Considerações finais

Portanto, as evidências sugerem que a dieta cetogênica aumenta o colesterol total, principalmente a fração LDL, e causa uma redução dos triglicerídeos. O processo de hipertrofia se torna prejudicado devido a menor ação da mTOR, porém, em associação com treinamento resistido o catabolismo muscular, o efeito pode ser atenuado.  Alguns estudos demonstraram uma melhor sensibilidade à insulina e um grande efeito sacietógeno. Alguns malefícios relatados pela literatura, como a sensação de fraqueza nas primeiras semanas, hipoglicemia, desidratação (menor reabsorção de minerais), efeitos gastrointestinais, ocorrendo uma maior constipação, e um possível efeito deletério na massa óssea.

Na aplicabilidade clínica, a dieta cetogênica é insustentável por longos períodos, pois as características dos alimentos são conflitantes com a cultura alimentar brasileira, do famoso arroz e feijão, porém, ela pode ser introduzida por um período curto de 8 a 10 semanas, para otimizar a melhora de alguns marcadores bioquímicos.

Referências Bibliográficas

  1.           Rezaei, S. Letter to the Editor on “The efficacy comparison of classic ketogenic diet and modified Atkins diet in children with refractory epilepsy: a clinical trial”. Acta Neurol Belg (2020).
  2. Paoli, A., Bianco, A., Grimaldi, K. A. (2015) The ketogenic diet and sport: a possible marriage? Exerc. Sport Sci. Rev. 43, 153–162.
  3. Owen, O.E. Ketone bodies as a fuel for the brain during starvation. Biochem. Mol. Biol. Educ. 2005, 33, 246–251.
  4. Leino, R.L.; Gerhart, D.Z.; Duelli, R.; Enerson, B.E.; Drewes, L.R. Diet-induced ketosis increases monocarboxylate transporter (MCT1) levels in rat brain. Neurochem. Int. 2001, 38, 519–527.
  5. Domingo JC, Izaola O, et al. Effect of DHA supplementation in a very low-calorie ketogenic diet in the treatment of obesity: a randomized clinicaltrial. Endocrine 2016; 54:111–122.
  6. Murphy EA, Jenkins TJ (2019) A ketogenic diet for reducing obesity and maintaining capacity for physical activity: hype or hope? Curr Opin Clin Nutr Metab Care 22:314–319.
  7. Burke LM. Re-examining high-fat diets for sports performance: did we call the ‘‘nail in the coffin’’ too soon? Sports Medicine. 2015;45(1):33–49.
  8. Paoli, A., Bianco, A., Grimaldi, K. A. (2015) The ketogenic diet and sport: a possible marriage? Exerc. Sport Sci. Rev. 43, 153–162.

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